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Sunna - A Deusa do Sol


Sunna era a personificação divina da luz solar, venerada pelos povos nórdicos como doadora da vida e cujos símbolos - a roda solar e os círculos concêntricos - foram encontrados em inúmeras inscrições rupestres originárias da era Neolítica e da Idade do Bronze. Apesar da importância dos cultos e mitos solares nas antigas sociedades nórdicas, existem poucas referências sobre Sunna nos poemas e mitos mais recentes. Nas línguas escandinavas e germânicas o gênero do sol é feminino e existem associações evidentes entre o sol e a deusa no norte europeu, como era de se esperar, tendo em vista a influência do sol para o florescimento da natureza e o amadurecimento das colheitas nos curtos meses de verão.

Nas escavações de vários sítios na Alemanha foram encontrados símbolos solares gravados sobre estatuetas femininas, oriundas dos primeiros séculos e.c. Há indicações de que essas imagens - representando uma deusa solar - faziam parte das práticas domésticas das mulheres; figuras semelhantes foram achadas em pequenos altares, nas ruínas de residências e nos túmulos, comprovando a extensão desta veneração.

Sunna regia o ciclo do dia e os ritmos da vida agrícola, que giravam em torno do nascer e pôr do sol, dos solstícios e eclipses e garantia a sustentação da vida em um clima frio e terra inóspita. Chamada de "noiva brilhante do céu" e "Senhora Sol", Sunna carregava o disco solar durante o dia, em uma carruagem dourada puxada por dois cavalos: Arvakr, "o madrugador" e Alsvin, "o veloz", sob cujas selas havia sacos com vento para mantê-los protegidos do intenso calor solar. Sunna se apresentava envolta por uma luz dourada, cujos raios formavam seus cabelos; horas antes do sol nascer, ela ficava sentada sobre uma rocha e fiava ouro com seu fuso dourado. Para conduzir a carruagem, ela segurava um chicote e um escudo chamado Svalin (o esfriador), para proteger a terra e os seres humanos do calor excessivo e destrutivo dos raios solares.

A trajetória de Sunna era marcada por dois períodos: durante o dia ela conduzia sua carruagem dourada percorrendo e iluminando o céu, do leste para oeste. Quando anoitecia, ela mergulhava no mar ou na terra e assumia a direção de um barco puxado por um enorme peixe, iniciando um trajeto inverso, do oeste para leste. No final da noite, antes do alvorecer, Sunna emergia lentamente do mar ou da terra, sentada novamente na sua carruagem dourada, com o brilho contido da alvorada e aumentando progressivamente seu brilho e calor.

Sunna é uma das três deusas que irão morrer no Ragnarök (junto com Bil e Hel), sendo alcançada e devorada pelos lobos Skoll e Hati, seus eternos perseguidores. Porém, antes de morrer, dará à luz uma filha, que, no alvorecer do Novo Mundo, irá assumir seu nome e continuará sua missão (conforme descrito no Mito da Criação). É possível que sua morte se deva ao fato de ter nascido como uma mortal (filha de Mundilfari, irmã de Mani, o regente lunar) e divinizada por Odin, devido à sua estonteante beleza e peculiar brilho dourado

Os povos antigos que reverenciavam Sunna ergueram em sua honra inúmeros círculos de pedras, destinados para a realização de rituais nas datas sagradas dos solstícios e equinócios. Um jogo antigo que foi preservado na Escandinávia e Alemanha era feito na primavera, quando jovens das comunidades "aprisionavam" uma moça no centro de um labirinto de pedras arrumadas em forma de espiral e depois a "libertavam" do seu cativeiro. Em todos os locais onde se realizavam danças e festejos primaveris, existia na proximidade um labirinto - de pedras, montículos de terra ou cavado no chão. Apesar de ter se perdido o mito que lhe deu origem, a dança em espiral permaneceu pelo menos um milênio após a cristianização. Estudiosos concluíram que o labirinto era conectado com o rito de passagem do inverno e a libertação do verão, resquícios de um antigo mito solar pan-europeu, centrado em uma divindade feminina.

Foram encontradas em inúmeros lugares, da Islândia até a Itália e a Rússia, centenas de labirintos, com desenhos intrincados e associados com as danças na primavera. O cristianismo incorporou muitos dos desenhos e símbolos solares nas igrejas erguidas sobre os antigos locais sagrados ancestrais. A teoria sobre a origem ártica desse ritual é apoiada pela reprodução do movimento do sol no céu nórdico pelo traçado do labirinto. Próximo ao Círculo Ártico o padrão anual do sol é diferente, formando arcos que se expandem e criando um labirinto, como se fossem fiados pelo fuso dourado de Sunna. Acredita-se que os labirintos escandinavos foram construídos 6 mil anos atrás, pois o culto da deusa solar no extremo norte data da pré- história, conforme indicam as inscrições com motivos solares. Durante a Idade do Bronze, o ato de fiar tornou-se metáfora para a produção da luz pela deusa cósmica, e assim as antigas culturas começaram a reverenciar uma tecelã solar.

Entre os símbolos das inscrições rupestres destacam-se os que descrevem objetos ligados à tecelagem como pentes, fusos e rodas de fiar, além de marcas de pés, um reconhecido símbolo feminino (associado com a genitália e o sexo) e representando a passagem divina para abençoar a terra com fertilidade. As marcas de pés aparecem sempre próximas às rodas ou barcos solares, a roda representando a carruagem do sol durante o dia, e o barco, o seu traslado noturno no reino dos mortos. Mais impressionantes do que as inscrições rupestres são as esculturas de bronze encontradas nos pântanos, a mais famosa sendo a carruagem solar achada em uma ilha dinamarquesa, datada de 1200 a.e.c. Ela tinha seis rodas, quatro sustentavam um cavalo, enquanto o último par levava um disco solar em uma carruagem acoplada, o disco sendo gravado com círculos concêntricos e espirais. Nas proximidades foi encontrada a estatueta de uma mulher nua, provavelmente uma deusa, vestindo apenas uma saia com franjas, uma das mãos segurando um seio, a outra sugerindo segurar rédeas. O colar por ela usado lembra os das deusas Frigga e Freyja.

Os adoradores de Sunna eram indo-europeus, ancestrais dos atuais escandinavos, islandeses, bálticos, eslavos, alemães e ingleses, que tinham em comum, raízes linguísticas, crenças religiosas, costumes populares e rituais. No texto dos Eddas, Sturluson enumera os vários títulos de Sunna: "Irmã da Luz, Fogo do céu e do ar, Sempre radiante, Roda brilhante, a Boa luz, Brilho sem sombra, Raios de cura".

Sunna tinha além das atribuições solares uma missão específica na mitologia nórdica, no seu aspecto de Alfradul, "a luz dos elfos" ou "a que iludia os anões". Na Escandinávia a deusa solar era associada com os anões, um fato intrigante, pois apesar deles e dos elfos escuros servirem a deusa, eles ficavam petrificados pelos seus raios e por isso viviam escondidos em grutas ou frestas da terra, longe do contato humano. Entre as várias explicações sugeridas, a mais plausível é a que considera os anões como responsáveis pela confecção do brilhante colar solar e pela construção dos círculos e labirintos de pedra.

As imagens solares eram usadas pelos poetas como metáforas para descrever a beleza das Valquírias, heroínas e deusas. As deusas Frigga e Freyja tinham atributos e correspondências solares como o âmbar, colares, gatos, carruagem, fusos e anões. Freyja, por exemplo, foi chamada em uma canção de Vana Solen - o belo sol -, de Gerda dizia-se que "irradiava uma luz dourada que iluminava o céu e a terra", a Valquíria Swanhild era "tão bonita que parecia um raio de sol" e várias mulheres foram descritas como "iluminadas pelo sol", com "rostos ou semblantes luminosos". Frigga, a Rainha celeste que possuía um fuso incrustado com joias em forma de estrelas, tecia as nuvens com fios de luz dourada. Nos contos de fada alemães são descritas várias crenças sobre a deusa solar chamada Frau Sonne e casada com Herr Mond (Senhora Sol e o Senhor Lua).

As deusas tecelãs flolle (Flolda) e Berchta (Perchta) descritas em inúmeras lendas e contos de fada da Alemanha, Áustria e Suíça, apareciam com características solares como: luz solar irradiando dos seus cabelos quando os penteavam, carruagens puxadas por joaninhas (associadas com o sol), procissões no início da primavera, chuva ou pedaços de ouro (presentes para as pessoas trabalhadoras e de boa índole), apelidos de "brilhante", celebrações no solstício de inverno e sua adaptação final pela igreja cristã na figura de Santa Luzia.

Reminiscências das antigas deusas solares são encontradas também nas tradições dos povos fino-úgricos, dos nativos sami - como Beiwe e Beiwe-Neida, Saule, a Mãe Sol, Paivatar - cujos mitos são centrados ao redor dos mesmos elementos: fuso, aprisionamento do sol ou seu rapto, o resgate feito por um herói, a fertilidade da terra ativada pelo calor solar na primavera, os espelhos redondos de bronze que refletiam a sua luz mágica e a comemoração dos festivais solares (solstícios e equinócios) com procissões, orações, rituais, danças circulares e festejos ao redor de fogueiras.




Fontes: Templo de Apolo, Norse Mythology
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