Tamamo-no-Mae é uma das figuras lendárias na mitologia do Japão antigo. Uma mulher de beleza estonteante que serviu o Imperador Konoe no fim da era Heian (794-1185). Segundo Otogizoshi (uma coleção de prosas escritas no Período Muromachi), ela era tão inteligente e graciosa que o Imperador se apaixonou na primeira vez em que a viu. Embora aparentasse ser bem jovem, era imensamente sábia. Mas, por trás de tanta beleza e sabedoria, Tamamo-no-Mae escondia sua verdadeira identidade.
Tamamo-no-Mae: A Lenda
Conta a lenda que em tempos idos, houve uma bela jovem que chegou ao palácio do Imperador Konoe. Ela era Tamamo-no-Mae, e era tão bonita e cativante que o Imperador se encantou por ela imediatamente.
Quando ele lhe perguntou o que poderia fazer por um visitante tão especial, ela lhe disse que gostaria de ficar no palácio. O Imperador não podia resistir a seus encantos e, completamente seduzido ele concordou.
Quanto mais tempo ela ficava no palácio, mais as pessoas ao seu redor a adoravam. Ela era a mulher mais bonita que já tinham visto. Tamamo-no-Mae não era apenas bonita, era também muito educada, elegante, e principalmente, inteligente. Ela possuía um infinito conhecimento em todas as disciplinas. Os eruditos do palácio muitas vezes gostavam de testar o seu conhecimento, e ela sempre passava em seus testes, superando todas suas expectativas. Notava-se que suas roupas nunca ficavam amassadas ou sujas, e que ela sempre emitia um cheiro maravilhoso.
O Imperador, que também gostava de sua companhia, encontrou-se profundamente apaixonando. Um dia, ele perguntou se ela queria morar com ele no interior do palácio. Tamamo-no- Mae concordou.
À medida que os dias foram passando, ela e o Imperador tornaram-se um casal, eles estavam sempre juntos, dia e noite, todos os dias da semana, eram quase inseparáveis.
Conforme o tempo passava, o povo do palácio notou que o Imperador estava ficando fraco. Até que um dia, ele estava tão gravemente doente que não podia sair da cama! Os funcionários do palácio também acharam estranho que num primeiro momento, Tamamo-no-Mae ficou apática, não demonstrando sinais de tristeza, nem qualquer emoção. Foi apenas quando o Imperador teve uma convulsão de quase morte que Tamamo-no-Mae ostentou sinais de inquietação e preocupação, às vezes até parecendo bastante confusa.
Um dos estudiosos do palácio tornou-se muito desconfiado de sua visitante misteriosa, que ele procurou a ajuda dos monges no alto das montanhas. Estes lhe disseram que como a quase perfeita Tamamo-no-Mae veio à sua cidade e encantou a todos, incluindo o Imperador, temiam que ela pudesse não ser o que ela parecia ser.
Os monges deram ao estudioso uma pequena varinha, e disseram-lhe para enganar Tamamo-no-Mae para tocá-la. Contaram que, quando ela a tocasse, ela iria revelar sua verdadeira natureza.
Retornando ao palácio ele imediatamente procurou por Tamamo-no-Mae. Ela se encontrava em se quarto olhando distraidamente pela janela.
O estudioso aproveitando a oportunidade de distração de Tamamo, perguntou se ela queria ir com ele para um outro teste de conhecimento, sugerindo aliviar sua mente das preocupações. Ele então ofereceu sua mão como se para convidá-la, e quando ela estendeu a mão, ele imediatamente pressionou a varinha contra a palma de sua mão.
No momento em que a varinha tocou sua pele, ela começou a esfumaçar, Tamamo-no-Mae assustada retraiu a mão com dor, mas já era tarde demais. Uma luz ofuscante veio do nada, e em meio a luz e fumaça, o estudioso ficou chocado ao ver um número de caudas desfraldar atrás da bela jovem.
O estudioso gritou para os guardas que irromperam a sala encurralando Tamamo-no-Mae que, em pânico, transformou-se totalmente em uma kyuubi (uma raposa de nove caudas). Ela saltou para fora da janela fugindo através da cidade em alta velocidade.
As pessoas, que antes a veneravam, ao vê-la, atiraram pedras e objetos pontiagudos, ferindo-na, que desesperada fugiu da cidade se dirigindo em direção às montanhas.
De volta ao palácio, o estudioso informou ao Imperador a verdadeira natureza de sua adorada Tamamo-no-Mae, uma kitsune que propositalmente o adoecera para tomar-lhe o trono. As Kitsunes (e Kyuubis) são criaturas conhecidas por usar seu charme para absorver a energia das pessoas, especialmente aqueles que se sentem mais próximos a elas.
Desolado e ainda fraco (mas em recuperação), o Imperador com pesar no coração, autorizou-os a "fazer o que precisasse ser feito", para o bem do seu povo.
Foram contratados então, dois guerreiros, conhecidos como Kazusa-no-suke e Miura-no-suke, especializados em caçar e matar raposas.
Demorou muito antes dos dois guerreiros a encontrar. Tamamo-no-Mae, a raposa, foi encontrada escondida nas montanhas, vitimando os viajantes errantes para seu alimento. Quando ela viu os dois guerreiros, atacou-os de imediato, mas eles eram muito hábeis esquivando-se facilmente de seus ataques.
De repente, Miura-no-suke disse em voz alta, "Sob a ordem do Imperador, um traidor como você deve ter uma morte dolorosa!!!"
A raposa parou de repente, em seguida, uma luz ofuscante voltou, e os dois guerreiros viram parada em pé diante deles a bela Tamamo-no- Mae, com nove caudas nas costas, e seus olhos cheios de lágrimas. Ela ficou lá tremendo, olhando para o chão, olhando com metade ódio e metade medo.
"Faça o que você precisa fazer", ela finalmente disse. "Mas eu não vou morrer sem lutar." Após estas palavras, ela redobrou seus ataques aos guerreiros com dentes e garras afiadas.
Os três tiveram uma luta longa e difícil, ficando gravemente feridos, com Tamamo-no-Mae transformando-se novamente em uma raposa e fugindo para as montanhas.
A raposa correu em direção às planícies, de novo em alta velocidade. Os guerreiros perseguiram-na, mas ela estava muito rápido, então um deles pegou um arco e flecha. Ele mirou a raposa em fuga, e após várias tentativas, ele acertou com êxito uma flecha no peito da raposa.
A raposa, uma vez que estava morrendo no chão, mais uma vez transformou-se na bela mulher que todos admiravam. Lágrimas quentes de tristeza, raiva e dor percorreu seu belo rosto, antes de finalmente morrer.
No momento em que ela deu seu último suspiro, ela se transformou em uma pedra negra amaldiçoada (Sessho-Seki). A pedra liberava um gás venenoso mágico, matando qualquer um que passasse perto dela.
A pedra ficou lá por muitas gerações, vitimando muitos. Até que uma noite, um monge passou, e preparou um ritual em torno da pedra amaldiçoada. Ele orou a noite toda, murmurando encantamentos e acendendo velas bentas e incenso ao redor da pedra.
Na manhã seguinte, ele levantou-se e aproximou-se da pedra, colocando a mão sobre a sua superfície, mas, milagrosamente, ele não foi prejudicado.
Ele, então, gritou para a pedra: "Já ouvi falar de sua história, Tamamo-no-Mae; de como na pele de um kyuubi você enfeitiçou o Imperador e teve o que mereceu, uma morte dolorosa e solitária. Mas eu sei que há muito mais do que conta a história, e eu gostaria de dar meu coração para ouvi-la. Por favor, eu quero saber a sua história real. "
Ele esperou alguns instantes, até que uma voz suave veio da pedra:
"Eu sou Tamamo-no-Mae, mas eu nem sempre fui Tamamo-no-Mae. Meu nome verdadeiro é Mizukume. Meu pai adotivo me encontrou na floresta como uma criança, não sabendo que eu já estava condenada a ser uma raposa de nove caudas, que é provavelmente por isso que meus pais verdadeiros me abandonaram. Quando eu tinha 17 anos, meu pai adotivo foi acusado de traição, e condenado ao exílio do palácio, o que levou à sua morte." Começou a contar...
"Eu estava muito irritada e sozinha, então decidi abraçar a minha metade kyuubi e imediatamente buscar vingança ao palácio. E, eventualmente, ganhar a confiança e amor do jovem Imperador, drenando lentamente sua força vital, mas me deparei com algo inesperado; Encontrei-me apaixonada por ele, o que não fazia parte do plano. Uma parte de mim não queria que ele se machucasse, ou morresse. Eu fiquei muito confusa sobre tudo. Tinha o meu coração partido antes mesmo que a flecha atravessasse meu peito, e isso é o que realmente me matou no final. Eu lhe imploro monge, não posso mais aguentar isso. Tenho sido amaldiçoada desde que nasci, e mesmo depois de morrer, ainda sou amaldiçoada. Matei tantos, na minha vida e na morte, que estou profundamente triste. Por favor, eu imploro, me liberte desta agonia."
O monge fechou os olhos, e ainda com a mão apoiada na pedra, ele murmurou um encantamento solene, que terminou com "Obrigado, Mizukume. Seja livre!".
Uma bola brilhante de luz se levantou da pedra, ascendendo ao céu. A pedra, sem sua maldição, se desfez em pedaços, tendo-os espalhados por todo o Japão.
Comments