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Yandi (炎帝) - O Deus do Sol


A lenda do Hou Yi, o Arqueiro que Derrotou Nove Sóis diz que por mandado do Imperador Celestial, Hou Yi desceu do céu para o mundo terrestre e destruiu nove dos dez Sois salvando a humanidade. Mas, e o que veio a acontecer ao último Sol? Em boa verdade, depois da queda celestial dos seus nove irmãos, mortos pelas flechas certeiras de Hou Yi, o decimo Sol adotou um tímido e submisso comportamento. Cada dia, de madrugada, levantava-se a oriente, depois, deslizava no vasto espaço aéreo e ao crepúsculo punha-se a ocidente - sem nenhuma negligência. Mas com o passar do tempo, ele começou a tornar-se cada vez mais preguiçoso e indolente, umas vezes absorto em divertimentos no lago Tanggu chegando ao céu muito atrasado, outras vezes, escondendo-se entre a ramagem da arvore Fusang e passando dez ou quinze dias seguidos a dormir, deixando assim o mundo ficar completamente às escuras e não se distinguindo a noite do dia. Por falta de raios solares, as ervas, as flores, as árvores e as culturas começavam a murchar, a temperatura descia vertiginosamente e o mundo tornava-se tão frio que ameaçava a sobrevivência da humanidade. Os homens, gado, aves, animais e todos os seres vivos permaneciam transidos de frio e quase agonizantes... Se o Sol continuasse a agir dessa maneira, o mundo acabaria por ficar sem vegetação e seres humanos.

Ao ser inteirado desta grave situação, o Imperador Celestial mandou imediatamente um mensageiro chamado Yandi para o oriente com instruções de acordar o Sol a tempo e de o supervisionar nos seus deveres cotidianos. Diariamente, Yandi seguia o Sol em um carro divino puxado por seis dragões controlando assim o seu percurso normal. Por Yandi ter a seu cargo o controle exclusivo do Sol, vieram a chamar-lhe o deus do Sol e deram-lhe igualmente o titulo de Soberano Oriental por ter passado a habitar nessas paragens.

Envergando uma túnica preta, um longo traje branco e com um ramo de Ruo na mão esquerda, o deus do Sol apresentava um aspecto iminente e poderoso. A árvore Ruo crescia apenas no céu ocidental e era luminescente, e, Yandi servindo-se do ramo que constantemente empunhava a laia de uma chitada, apressando com este o Sol e não o deixando negligenciar-se no cumprimento dos seus deveres. O deus do Sol também utilizava o ramo para limpar o céu das nuvens negras e poeiras que eventualmente o cobrissem e impedissem o Sol de brilhar na terra. Na sua mão direita, o deus Sol segurava um gigantesco arco pronto a disparar uma pontiaguda flecha ao "lobo celestial". Reza a tradição que, do mesmo modo que na terra, no céu também existiam nocivos abumais selvagens, um dos quais o "lobo celestial" - conhecido pela sua ferocidade e especialmente voraz das estrelas do céu, mas que, também, não desdenhava atacar o Sol e a Lua quando a fome apertava. Yandi estava também encarregado de defender o Sol contra as investidas desta besta.

Para que o Sol se levantasse a tempo, de madrugada, e não se atrasasse no seu trabalho, o Imperador Celestial mandou o galo de jade ficar em um ramo da Arvore Fusang, onde o Sol dormia a noite, de modo que este o acordasse na hora marcada. Com as suas penas luzidias e brilhantes, de bico e garras douradas e uma vistosa crista vermelha, ele cantava harmoniosamente o seu cacarejo ouvindo-se em um raio de mais três mil quilômetros. O galo de jade era muito cauteloso. De madrugada era sempre o primeiro a acordar e esticava o seu pescoço para cantar o mais fortemente possível e mal ele se punha a cantar os gatos de todo o mundo ecoavam, sucessivamente, os seus cacarejos. Assim, era impossível ao Sol não se levantar na hora e deixar para mais tarde o cumprimento da sua tarefa diária. No seu carro divino puxado por seis dragões, Yandi fazia o Sol deixar o lago Tanggu para começar a sua travessia celeste cotidiana ate que, chegado a montanha Yanzi, a ocidente, o Sol se retirava pausadamente. Atrás desta montanha situava-se o imenso lago Mengshui onde o Sol se banhava sistematicamente, dissipando a sua fadiga no fim de cada dia de trabalho. Depois de se banhar, o Sol mergulhava no reservatório Yuyuan, um abismo sem fundo que se ligava ao lago Tanggu a oriente. Levado pela corrente impetuosa que existia entre ambos os tanques, o Sol regressava rapidamente ao lago Tanggu, de onde subia a arvore Fusang para ali dormir cômoda e calmamente até o próximo canto do galo.

Os humanos respeitavam o Sol e Yandi e estavam-lhes profundamente gratos, porque devido ao continuo empenho de ambos, eles podiam gozar do beneficio da luz e do calor benfazejos e o mundo tornava-se, progressivamente, cada vez mais fértil e belo.

Ora, estava um dia o deus Sol, como de costume, conduzindo o seu luxuoso carro através do céu, quando, de repente, os seis dragões da sua equipagem, sentindo-se sequiosos, decidiram estacar a sua corrida. Na sua frente estendia-se o rio Vermelho cujas aguas serpentendo ao longo do vale eram tão transparentes e claras que se podia ver o seu fundo. Mas, por que se chamava a este de rio Vermelho? Porque tinha a sua origem na montanha das Flores de Pessegueiros, e ao longo das suas margens existiam inúmeras destas árvores - tanto nas vertentes, como nos vales -, na primavera, as suas flores tingiam-se de uma cor vermelha. Para matar a sede dos dragões, Yandi decidiu então, ali levar os animais de modo a que estes se pudessem refrescar.

Eis, senão, quando lhe chegou aos ouvidos a melodia de uns gorgolejos e retintins provenientes de uma rocha da montanha. Os sons eram suaves e maravilhosos, mas também de uma tristeza e melancolia contidas. Dir-se-ia o doce salpicar das aguas de uma Conte contra umas pedras. Olhando na direção de onde provinha o som, Yandi deparou-se com uma bonita jovem sentada junto a uma fonte e tocando um instrumento musical de cordas.

Ela chamava-se Ting Wo e era a filha da deusa das Aguas do rio Vermelho. Há anos que vivia solitária na montanha, sem companhia, tendo como seu único consolo o instrumento que tocava, afastando deste modo, para longe de si a solidão dos tristes dias.

Murmurante e lamuriosa a melodia do instrumento, sincopada pelo som da agua da fonte, soava como que proveniente de uma grande lonjura. Todos quantos por ali passaram e ouviram este estranho som, chamaram este local de Fonte Melancólica.

Ora, ouvindo o som desta suave musica, o deus do Sol decidiu aproximar-se, pé ante pé, acabando por se recostar em uma grande pedra ouvindo maravilhado e atenciosamente. A jovem, que não tinha dado conta da chegada de Yandi, continuou absorta a tocar o seu instrumento. A sua musica era tão emotiva que até as ervas das margens do rio e as flores dos pessegueiros pareciam querer alquebrar-se em pranto. Quando a jovem, por fim acabou de tocar, Yandi exclamou sem se poder conter:

- Oh, como era belo! Fez-me constranger o coração!

Ao ver o jovem alto e elegante, de pé, do seu lado, a jovem involuntariamente corou de vergonha e fez menção de ir embora.

- A sua musica transmitia uma extrema sensibilidade e era de uma requintada harmonia, mas por que era tão melancólica? - perguntou-lhe Yandi com um misto de simpatia e compaixão.

A jovem Ting Wo, envergonhada pela súbita aparição deste desconhecido e sobretudo sentindo-se interrogada por um tão belo rapaz, limitou-se a sorrir apologeticamente baixando a sua cabeça.

- Mas veja, não acha que a paisagem da primavera maravilhosa? A terra esta repleta de vida e vitalidade, dos ramos das arvores os pássaros cantam a viva voz, os peixes divertem-se chapinhando livremente nas aguas, banhados pelos soalheiros raios solares da primavera os trabalhadores diligentes ocupam-se das sementeiras, pela brisa primaveril as ervas e arvores... Por favor, toque uma peça alegre!... - implorou-lhe o deus do Sol cheio de otimismo e soltando umas gargalhadas.

Yandi tinha um aspecto sempre alegre e franco temperamento. Estas palavras impressionaram tão favoravelmente a jovem que sentiu como que um clarão de alento penetrar-lhe ate o fundo do coração, e então, erguendo a cabeça e olhando Yandi viu-se apoderada por uma estranha alegria e afeição; todavia, sendo demasiado acanhada para revelar o que lhe ia pelo espirito, a jovem baixou de novo a cabeça e recomeçou tangendo as cordas do instrumento emitindo sons bem diferentes dos anteriores, desta vez repletos de doce suavidade e de contida esperança.

Mas, infelizmente, o deus do Sol tendo a importante tarefa de controlar o percurso do Sol a seu cargo, não pôde permanecer por muito tempo e teve de se limitar a sorrir jovialmente a jovem, acenando-lhe um adeus apressado e retomando sem mais demora o seu caminho.

Durante todo o resto do dia, ao longo de todo o seu percurso, os sons do instrumento da jovem continuaram a soar-lhe aos ouvidos, a linda imagem de Ting Wo pairando constantemente frente aos seus olhos. Em boa verdade, o deus do Sol começava a dar-se conta que estava apaixonado pela graça e beleza da jovem.

Desde então, todas as vezes que o deus do Sol passava pelo rio Vermelho fazia ali uma paragem com o pretexto de beber agua ou de descansar sendo, no entanto, a sua verdadeira intenção conversar um pouco com Ting Wo ou ouvi-la tocar o seu instrumento musical... não havia duvida de que ela ficava muito contente com a presença de Yandi. As suas melodias já não soavam agora melancolicamente, mas sim alegres e empolgadas.

Desta maneira, ambos os jovens passaram a desfrutar de um mutuo amor, acabando por virem a se casar e a viverem em completa harmonia e afeição.

Do casal, nasceram um filho e duas filhas que vieram a se chamar, respectivamente, de Yan Ju, Yao Ji e Nu Wa. Não existe nenhuma lenda relativa aos feitos de Yan Ju, mas os destinos das duas filhas ficaram para a posteridade nos contos Chang E, a Desterrada Beleza da Lua e Jing Wei, a Vingadora do Mar.



Fontes: Templo de Apolo, Cultura Chinesa, Mitos da Cina, Mythology & Culture, ChinesaABNTABREU,Antônio Daniel.Yandi, o deus do sol.in:__________.Mitologia Chinesa - Mitologia Primitiva:Quatro mil anos de história através das lendas.2ª Ed.São Paulo/SP:Landy Editora,2006.p.95-102.
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